sexta-feira, 28 de março de 2014

A liberdade aprisionada aos 18 anos!




                        Era uma vez.....
            Esta é uma estória real de um cidadão militante, que vivenciou momentos desalentadores, crueis e sanguinários no Brasil, durante a ditadura militar! A população mais jovem precisa saber, que nos anos 60 e 70 golpes militares iniciaram ciclos de ditadura na América Latina; e no Brasil houve o golpe militar, que depôs o presidente eleito pelo povo, João Goulart, e muitas pessoas foram torturadas, desaparecidas (até hoje) e assassinadas; hoje temos uma Comissão da Verdade, mas muita coisa está velada e fechada com muitas chaves, ainda.
            Em 1964, na cidade de Belo Horizonte, um jipe do Exército estaciona na porta da casa dos meus avós, Divaldo e Glória, pais da minha mãe, descem dois homens armados em trajes civis, adentram a casa, a procura do Gilney, meu tio; apenas meu avó estava em casa, e muito assustado, diz que ele se encontrava no trabalho, no Banco de Desenvolvimento, sem saber o que estaria por vir. Lá foram eles determinados, até o 22˚ andar do banco, na busca de mais um militante, estudante, idealista, que incomodou o sistema por expressar sua insatisfação e lutar contra o momento político de repressão, de um regime militar.
            No dia 30 de abril de 1964 Gilney foi preso, um jovem de 18 anos, no seu local de trabalho, iniciando uma trajetória de momentos sofridos, inesperados e assustadores, para toda a família e para o país inteiro, pois muitos jovens faziam parte desta luta, e a incerteza de quem voltaria pra casa.
            Foi preso e passou a noite onde estava o QG da repressão. Já no primeiro dia, fizeram um terror psicológico, com ameaças de fuzilamento e antes do interrogatório sofreu violência física, socos e pontapés. No outro dia foi encaminhado ao DOPS.
            Logo que a família soube onde se encontrava Gilney, meus avós foram ao DOPS, abraçá-lo, esse era o desejo de toda a família, protegê-lo. Lá, de frente ao delegado Tharcy Sia, este foi logo dizendo: "Seu filho é comunista, por isso está preso. E diga a ele para colaborar." E a visita foi apenas de 10 minutos. Meu avô, mesmo discordando das idéias do filho, ali estava emocionado, nada falava, e minha avó com muitas perguntas, queria saber como estava sendo tratado e saíram dali certos que estariam sempre ao lado do filho e lutariam por sua liberdade. E a luta da chamada "mãe do preso político" iniciou, sem minha avó ter noção do que vinha pela frente.
            Logo foi transferido para uma Penitenciária, em Neves, afastada de Belo Horizonte, que havia sido inaugurada recentemente por estudantes, sindicalistas, intelectuais, pessoas das Ligas Camponesas, dos Grupos de 11, comunistas e todos que eram considerados subversivos, porque eram opositores políticos aos generais.
            Na luta diária da família pela soltura do Gilney foi concedido uma prisão domiciliar, sob o compromisso de não viajar. Assim ele pode retornar aos estudos e trabalho. Inicia o curso de medicina em 1966, mas foi  expulso do curso de medicina da UFMG, pelo decreto 477 e a luta política continuou.
            Tempos difíceis (1967/69) no governo de Costa e Silva, que institucionaliza o AI-5, que permitia que líderes contrários ao regime fossem perseguidos, torturados e presos sem a necessidade de uma intervenção judicial. Além do mais, os presos políticos não tinham direito ao recurso do habeas corpus, fazendo com que as liberdades individuais e direitos constitucionais fossem suspensos. Uma ditadura que elimina a tentativa de liberdades públicas e democráticas.
            Ao contrário do que a família queria acreditar, a participação de Gilney nos campos da luta política não cessou e era cada dia mais intensa, nos movimentos de luta, passeatas e ele sabia que a qualquer momento poderia ser preso ou morto. Naquele momento sua vida representava a luta pelo país, pela democracia, pela liberdade de expressão e justiça social; maior que a sua vida e a da família.
            A casa caiu para meus avós, quando, no dia 21 de março de 1969, foram surpreendidos com o noticiário da TV, acusando Gilney de assalto e tentativas de homicídio. Não durou muito, os policiais adentraram a casa de meus avós, mais uma vez, e logo após o pessoal do exército, do DOPS e da polícia militar, e promoveram uma verdadeira ocupação; ou seja, reinicia a temporada de busca do Gilney e de tortura e tormento à vida familiar. O último dia que Gilney esteve em casa fora o dia 19 de março. Ainda em Belo Horizonte enviou um bilhete à família, dizendo que estava bem de saúde e justificando sua luta armada. Explicou o ocorrido, que ele não havia sido o agente direto e que o acontecido havia sido um acidente.
            No final de 1969, a família recebeu uma carta do Gilney e a felicidade foi geral, por saber que ele estava vivo. Nesta carta ele fazia também referências a nós, sobrinhos e sobrinhas, enviando-nos beijos e abraços. Tamanha sensibilidade e amor em pensar em todos nós, com tantos problemas e preocupações na sua mente. Ainda muito crianças participávamos também, com sofrimento, desse episódio, que durou muitos anos. Era uma carta cheia de dor (pelos amigos mortos), também resignação e perseverança. A dor era grande pela repressão política e principalmente, pela morte do Marighella, em 04 de novembro de 1969.
            Da dor, não só pelo filho, mas do país inteiro, nasce a resignação e  compreensão da minha avó Glória, uma guerreira, que não estava sozinha na luta, se juntando ao movimento de solidariedade dos familiares de presos políticos e assim esteve acompanhando as prisões em Ilha Grande, Milton Dias Moreira, no RJ; Penitenciária de Juiz de Fora; o DOPS, a penitenciária feminina de BH; além dos tribunais militares, quarteis do exército, em MG. 
            Gilney foi levado ao Doi-Cod/RJ, depois no Dops/RJ, passou para o Presídio Provisório, uma tortura psicológica, além da tortura física, de todas as formas. Quando meus avós chegaram ao Rio de Janeiro para visitá-lo, já havia sido transferido para o presídio da Ilha Grande. E assim seguiram ao encontro de Gilney, persistentes. Na Ilha, Gilney conheceu o Gabeira, que estava entre os 20 presos políticos transferidos, que o ajudou na indicação de uma advogada.
            Logo Gilney foi transferido para Juiz de Fora. Essa era uma estratégia, não permanecer muito tempo em um local. Eles deixavam minha família louca, sem saber do paradeiro de meu tio. Quando chegaram ao RJ, para mais uma visita, ficaram sabendo que ele não se encontrava mais no presídio da Ilha Grande.
            Foram quase 10 anos de prisão, dentre estes, ficou preso 7 anos em Juiz de Fora (Linhares). Lá era um presídio civil sob administração militar. O exército não permitia leitura, inicialmente. Meu tio, todas as semanas escrevia uma carta pra meus avós, queria livros, queria receber cartas, precisava ler para se sentir vivo! Alguns dos presos em Linhares foram enviados ao exílio em troca da liberdade do embaixador alemão. Gilney não estava na lista. Um certo dia fui com minha mãe e minha avó visitá-lo e lá o vi por uma portinhola, um quadrado pequeno, que víamos apenas o seu rosto, tendo que minha mãe levantar-me. Saí assustada.
            Em 1971 as coisas ficaram mais complicadas. Eles fizeram uma greve de fome, por melhores condições carcerárias, contemplando também outros companheiros e companheiras de luta, em outros presídios. Em setembro, as visitas foram suspensas, pois o QG acusou os presos políticos de tentativa de motim. O Exército tinha Gilney como chefe da Corrente da Ação Libertadora Nacional (ALN), assim ele ficou segregado de outros presos políticos. Como era de se esperar foi um dos primeiros da lista para ser mais uma vez transferido para o Presídio Político do Rio de Janeiro.
            Meu avô desencarnou em 1973. Gilney compareceu ao enterro acompanhado de 4 policiais armados. Sem muito tempo, abraçou e beijou minha avó, sem dizer palavras, com muitas lágrimas escorrendo pelo rosto e foi embora.
            Enfim, no dia 21 de dezembro de 1979 Gilney saiu do cárcere político, sob liberdade condicional, diante de muitos entraves burocráticos. Saiu trazendo marcas indeléveis de torturas, humilhações, ameaças, punições, a dor pelos companheiros e companheiras desaparecidos e mortos, mas trazia também a força e coragem da luta digna, por uma Nação livre de repressão, pelos direitos fundantes de liberdade de expressão e ir e vir e por um Estado Democrático de Direito.
            Voltou a estudar apenas em 1980, quando a escola de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais lhe restituiu o direito à matrícula. Foi morar em Belo Horizonte com sua companheira Iara, e viveu dias difíceis, em todos os sentidos, principalmente financeiro, sobrevivendo da produção e venda de artesanato, que  aprendera na prisão.
            Gilney respondeu a dez processos e só em 1985 terminou sua condenação. Mudou-se para Cuiabá e continuou sua luta política no PT, se tornando professor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), deputado federal (1995-1998) e estadual (1999-2002) pelo PT, do Mato Grosso.
            Entre 2003 e 2007 foi o secretário de políticas para o Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente (MMA) ao lado da ministra Marina Silva.
            Hoje, Gilney é responsável pelo projeto de Direito à Memória e à Verdade da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos e atua incansavelmente como coordenador, na luta pela formação dos comitês pela verdade nos estados. A Comissão da Verdade prevê 27 ações programáticas e o eixo número seis trata especificamente do direito à memória e à verdade em relação às crimes políticos como mortes, tortura e desaparecimentos.

            Impossível esquecer! Queremos nossas memórias nos livros!

sábado, 8 de março de 2014

Mulher- de ser Feliz!

Mulher, escrava, submissa!
Quem continua a sê-la?
Mulher, menina, um dia,
Mulher de qualquer jeito!
Esposa, amante, mãe, avante!
Mulher, seu ventre pulsa pela vida,
Seu peito alimenta e vibra!
Tem medo, mas por que tanta violência?
Tá viva? Levante! Não omita o grito surdo, que te oprime. Grite!
Abra a porta fechada e saia.
Não queira o que não quer!
Mulher, sem medo, forte, guerreira, em todo mundo!
Batom, sandália, óculos e sorrisos!
Onde trabalha? Quanto ganha?
Queira mais, você é capaz!
Mulher, sempre de muito valor!
Se ame antes de ser amada.
Sua vida é sua história e,
seu destino lhe pertence.
Qual o problema? Vá a luta pela vida!
Encontrará as saídas!
Parabéns Mulher, sempre!
Você é a força viva de cada dia!